mercredi 24 mars 2010

África minha


Quando eu vi pela primeira vez o filme de Sidney Pollack senti um cocktail de emoções muito particular, muito especial que me empurrou para longe... Depois de reflectir um pouco descobri porquê. É que no filme, por trás do romance entre Robert Redford e Merryl Streep, escondem-se outras histórias de amor, todas elas correspondidas. O amor latente e velado entre amo e serviçal e vice-versa, o estranho amor baseado no profundo respeito entre um caçador e as suas presas e vice-versa e o amor de uma dinamarquesa por África e direi igualmente "e vice-versa" porque acredito que uma terra que é amada ama em retorno. Digo isso porque sinto assim e porque creio que o meu fascínio por esse filme está ligado a uma espécie de ressonância que sinto cada vez que o vejo. Ressonância de sons, de cheiros, de imagens e de emoções que vêm de bem longe... da África da minha infância.

E é então que chega de novo até mim um tempo feliz, de despreocupação total, de pés descalços na terra, de aventuras mil imaginadas e vividas com os meus sobrinhos (que são quase da minha idade) e primos.

E ecoam em mim os sons de África. O barulho da cozinha do restaurante Haiti que ficava lá no prédio (será que ainda existe?) e os ruídos que vinham da oficina de automóveis que ficava mesmo ao lado, e os cantares tristes e cadenciados das lavadeiras enquanto desfaziam as trouxas de roupa e lavavam lá no tanque...

E ecoam em mim os cheiros de África. O cheiro inconfundível e intenso da terra quente e molhada ainda a exalar vapor depois de uma trovoada daquelas que iluminava o céu todo (nunca na minha vida vi coisa igual) e o cheiro a chá e bolinhos do apartamento dos meus avós que ficava pegadinho com o nosso...

E ecoam em mim as imagens de África. O padrão das cortinas do meu quarto de menina, as formas geométricas dos vasos de flores que enfeitavam as varandas e aquele corredor imenso... interminável... que acabava no torreão de vidro e onde se disputavam as corridas de bicicleta mais radicais, mais loucas e mais perigosas que eu já vi na minha vida!!
E aquelas retas estreitas que desapareciam na linha do horizonte e que tínhamos de percorrer quando íamos de Luanda para Nova Lisboa e que os animais selvagens gostavam de ocupar de vez em quando, o que era sempre motivo de festa e de exclamações por parte de adultos e miudagem. E, claro, aquela sensação de imensidão que se tinha quando se subia num morro e olhávamos a paisagem até lá onde a terra desaba...

Ecoa em mim, enfim, a felicidade de uma meninice bem vivida e livre de medos em que todos desejávamos ir dormir depressa porque queríamos acordar logo para ir correndo viver o dia novinho em folha que ia chegar e que nos preparava sempre agradáveis surpresas.
África minha e amada!!

2 commentaires:

  1. Sabes bem que " Africa Minha " é também o meu filme de eleição !!! Para mais, e nem sei como aconteceu, eu li o livro uns 10 anos antes do filme sair........e quando o filme apareceu, recordo-me de pensar.......como será possivel realizar um filme que é todo ele feito de pensamentos, de prazeres interiores, de emoções, de vitorias e derrotas, de injustiças e de amor, pelo amor, pela liberdade, pelo respeito, pelo natural. Adorei o teu texto.....deu para ver-te com 10 anitos, lá , perdida na imensidade daquela terra linda, e no clima dos anos 40.

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  2. O que me encanta é como consigo fazer parte da sua infância quando leio este post.
    É mágico como consegues penetrar dentro da gente e nos fazer viajar mesmo.
    Chego a sentir um calor no meu rosto e o agradável cheiro do bolo que marcou minha infância também.
    Obrigada por me fazer lembrar de coisas boas!!!

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